domingo, 17 de maio de 2009

Desocupação da Raposa Serra do Sol termina até junho, diz juiz do TRF

Desocupação da Raposa Serra do Sol termina até junho, diz juiz do TRF
17/05/2009 - 12h38 ( - G1)













foto: Foto: Fausto Carneiro/G1
Crianças da etnia macuxi na Vila Surumu, porta de entrada da reserva índigena Raposa Serra do Sol, em RoraimaDuas semanas após o fim do prazo para a desocupação da Raposa Serra do Sol, representantes do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) continuam na reserva indígena, em Roraima, para cumprir a ordem do Supremo Tribunal Federal (STF). Em entrevista ao G1, o juiz auxiliar do TRF Lincoln Rodrigues de Faria afirmou que até o começo de junho a reserva estará totalmente desocupada pelos não índios.

"Esperemos concluir todo o trabalho até o fim deste mês, o mais tardar no começo de junho", disse o juiz. "As questões mais preocupantes já foram solucionadas. Agora falta resolver algumas questões logísticas", completou Faria, que é membro do grupo que comanda a operação de desocupação da reserva, liderado pelo presidente do TRF-1, Jirair Meguerian. O prazo para a retirada dos não índios se encerrou no dia era 30 de abril.

Lincoln Faria retorna a Roraima na segunda-feira (18). Ele tem se revezado com outro magistrado do TRF na região para garantir o cumprimento da decisão do STF, que, no dia 19 de março, definiu a legalidade da demarcação contínua da área e estabeleceu que apenas índios pudessem habitar a reserva.

Gado

Entre as pendências a serem resolvidas, o juiz destaca a necessidade de retirar pelo menos cinco famílias que permanecem na região. Três delas ocupam o Vale do Miang, localizado na fronteira com a Venezuela. Segundo Faria, esses remanescentes têm prazo até esta quarta-feira (20) para deixarem o local.

O juiz explicou que as famílias de fazendeiros permanecem na Raposa Serra do Sol por serem proprietárias de cerca de 300 cabeças de gado que ainda não obtiveram autorização para serem removidos da área.

A explicação é logística. De acordo com o Lincoln Faria, como a região é montanhosa e de difícil acesso, para o gado sair do local é preciso passar por território venezuelano. A Justiça brasileira já pediu a licença sanitária para o país vizinho, mas ainda aguarda a autorização para iniciar a retirada do gado. Caso o aval não seja obtido, não se descarta a possibilidade de o governo do Brasil comprar o gado e indenizar os criadores.

Além dos não índios que permanecem no Vale do Miang, o juiz disse que outras "duas ou três famílias" continuam em uma das vilas da reserva, aguardando apenas a conclusão de suas novas moradias. Segundo Faria, elas já teriam concordado em se mudar para casas populares em um bairro da periferia de Boa Vista, capital de Roraima, para onde grande parte dos ex-moradores da Raposa Serra do Sol já seguiu.

Outro caso a ser resolvido é o de um senhor de 83 anos, que diz ser filho de uma índia. "Estamos aguardando ele provar que é filho de índio", disse. "Caso ele comprove, poderá permanecer desde que siga os costumes indígenas", explicou.

Balanço

O ministro do STF Carlos Ayres Britto, relator do processo da Raposa em Roraima, autorizou os juízes do TRF1 a assinarem alvarás de liberação dos valores referentes a indenizações de não índios que tiveram que deixar a reserva. Para Lincoln Faria, a medida deve agilizar o processo de reparação dos ex-produtores.

Na próxima sessão plenária do Supremo, marcada para quarta-feira (20) à tarde, Ayres Britto pretende apresentar aos colegas ministros um balanço sobre a desocupação da reserva. Na ocasião, ele deve elogiar a forma como o presidente do TRF-1 conduz a desocupação da reserva. Ainda em março, no dia que o STF concluiu o julgamento da Raposa Serra do Sol, Britto designou Jirair Meguerian como o responsável pela execução da ordem do Supremo.

Exército peruano vai intervir em protestos indígenas na Amazônia

/ mundo CELULAR RSS O Portal de Notícias da Globo

17/05/09 - 10h12 - Atualizado em 17/05/09 - 10h22


Exército peruano vai intervir em protestos indígenas na Amazônia
Exército vai ajudar a polícia a manter o funcionamento de estradas, aeroportos e outros serviços essenciais.

Da BBC
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O governo do Peru autorizou que o Exército apoie a polícia por 30 dias, na escalada de disputas sobre recursos da Amazônia com tribos indígenas.



As forças armadas vão intervir para garantir o funcionamento de estradas, aeroportos e outros serviços essenciais, informou o ministro da Defesa peruano, Antero Flores Aráoz.



Na véspera, manifestantes anunciaram que iam começar uma insurgência para defender seus direitos, mas a ameaça depois foi retirada.



Cerca de 30 mil manifestantes vêm protestando na região da Amazônia peruana há um mês.



O presidente Alan García disse que todos os peruanos devem se beneficiar dos recursos naturais do país, e não apenas "um pequeno grupo de pessoas que mora lá".



"Temos que entender que, quando há recursos como petróleo, gás e madeira, eles não pertencem apenas às pessoas que tiveram a sorte de nascer lá", disse García.



De acordo com a constituição peruana, o Estado é dono da riqueza mineral e de hidrocarbonetos do país.



Territórios antigos
Na sexta-feira, Alberto Pizango, o chefe da organização peruana de índios da amazônia (AIDESEP, na sigla em espanhol), disse que o diálogo com o governo havia sido interrompido.



Segundo Pizango, seus territórios estavam sendo entregues a multinacionais sem que a população tenha sido consultada.



Mas Pizango negou que seu movimento - que reúne 65 grupos indígenas - seja contra o progresso.



"O que queremos é desenvolvimento sob nossa perspectiva", disse ele.



No dia 8 de maio, o governo do Peru decretou estado de emergência por 60 dias em partes da Amazônia peruana, onde manifestantes interromperam serviços de transportes, incluindo aeroportos e pontes.



Há grandes interesses em jogo, segundo o correspondente da BBC em Lima Dan Collyns. No mês passado, a empresa de petróleo francesa Perenco prometeu investir US$ 2 bilhões apenas em um campo de petróleo na selva.



As comunidades indígenas reclamam que cerca de 70% do território da Amazônia peruana está sendo "alugado" para a exploração de gás e petróleo, colocando em risco tanto suas vidas como a biodiversidade da região.



A Amazônia peruana é a maior área da floresta fora do território brasileiro.



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Índios e franceses, o primeiro encontro

atualizar sem data AlertaVoltar para a edição de hojeHISTÓRIA
Índios e franceses, o primeiro encontro
Em 1504, o navegador Binot Paulmier de Gonneville contatou os índios Carijó que viviam no Norte de SCPouco depois de Pedro Álvares Cabral ter dado com a “terra brasilis”, um capitão francês, Binot Paulmier de Gonneville, içou velas em sua pátria na cidade de Honfleur (24/06/1503), e foi, margeando a costa da África, em busca de territórios a serem explorados nas Índias. Para tanto, os marinheiros haviam até contratado dois lusitanos secretamente, os quais conheciam bem a rota. Mas uma tempestade, na altura do Cabo da Boa Esperança, fez com que Gonneville perdesse o rumo e fosse aportar em terras incógnitas.

Mesmo sem ter clareza sobre a região onde estava, Gonneville e sua tripulação desembarcaram da avariada nau L’Espoir (A esperança) e toparam com índios: silvícolas hospitaleiros que os auxiliaram nos reparos da embarcação e no restabelecimento depois de tão penosa viagem. Tal convivência iria se prolongar por seis meses, marcada antes por harmonia e cordialidade. Gonneville estava, com sua tripulação, sem saber, no Sul do Brasil. A agradável convivência entre os franceses da L’Espoir e os índios Carijó (ou, possivelmente, segundo levantamentos do arqueólogo Francisco Silva Noelli, os Jê) constitui-se, conforme Leyla Perrone-Moisés (Vinte luas, Cia. das Letras, 1992), numa página diferente da colonização, pois não foi marcada por agressões. Com efeito, os Jê não eram canibais, portanto não teriam aterrorizado os franceses. Na Páscoa de 1504, o capitão de Gonneville fez, inclusive, que se plantasse uma cruz numa colina, com a ajuda dos índios.

Após seis meses de coabitação, os franceses decidem retornar à Europa. Como todos os descobridores, obedecendo ao costume da época, desejavam levar peças do Novo Mundo consigo, sobretudo a fim de mostrar à corte o que encontraram. Assim, navios partiam cheios de animais, plantas e outras coisas. E até pessoas. Gonneville, por exemplo, obteve autorização do cacique Arosca para levar o mais novo de seus filhos, um índio adolescente de 15 anos, cujo nome era, provavelmente Içá-mirim (Formiga pequena) e que, na pronúncia francesa, transformou-se em Essomericq. Junto dele foi um pajem, Namoa. Arosca via no traslado a oportunidade de seu filho instruir-se na “civilização” dos amigos brancos e o capitão Gonneville prometeu devolver-lhe o filho em “20 luas”, de acordo com a contagem dos tribais.

Mas o retorno foi marcado por desastres: margeando provavelmente Porto Seguro, os franceses toparam com Tupiniquins. Estes eram canibais e acabaram por devorar alguns desavisados que arriscaram descer do navio. Uma segunda parada, mais acima, fez com que vissem, decerto, os Tupinambás, já mais habituados à presença europeia. Os franceses foram, então, mais prevenidos, mas conseguiram abastecer o navio com pau-brasil e algumas riquezas.

Quem, no entanto, dizimou a frota de Gonneville foram piratas no Canal da Mancha. A L’Espoir foi saqueada e naufragou; dos 60 tripulantes iniciais, somente 31 se salvaram. Entre eles, o índio Essomericq. Àquelas alturas, o índio já fora batizado durante o traslado com o nome de seu padrinho, Binot Palmier de Gonneville, pois ficara doente. Seu pajem, Namoa, morrera a bordo.

Pelo trauma dessa viagem, o capitão Gonneville, comerciante, armador, não conseguiu organizar um retorno às longínquas terras tropicais. No entanto, pela palavra empenhada ao cacique Arosca, o capitão viu-se obrigado a dar um destino próspero a seu afilhado. Fez dele, então, herdeiro de suas armas e bens, casando-o com uma parenta. Da possivelmente primeira união oficial entre europeus e índios brasileiros nasceram 14 filhos. E Essomericq chegou a contar 95 anos de vida.

O naufrágio de Binot Paulmier de Gonneville levou-o a fazer uma relação de viagem, dando conta do prejuízo que sofrera e de alguns detalhes do que encontrara. Tal relação só foi encontrada no século 19, em Paris, na Biblioteca do Arsenal; tratava-se de uma cópia autenticada pelos tabeliães de Ruão, respondendo a um pedido compulsório do rei Luís XIV. Esse pedido fora feito para atender a um de seus colaboradores, o influente abade Jean Paulmier de Courtounne, bisneto do índio Essomericq. Explique-se: em 1658, o ilustre cônego fora surpreendido pela cobrança de um imposto, o chamado droit d’aubaine, que os estrangeiros deviam ao rei de França. Somente a relação de Gonneville poderia prestar esclarecimentos à então nobre família que se dizia, sim, descendente de um “príncipe” (lembre-se que Essomericq é filho de um cacique).

O abade foi então solicitar em Ruão uma cópia autêntica da relação, o que lhe foi recusado, pois o documento era secreto já que tratava de descobertas de terras novas. Daí a intervenção do rei Luís 14. Aproveitando a ocasião, o abade escreveu um memorando a fim de obter financiamento para uma nova viagem às terras supostamente descobertas por seus ancestrais em 1504.

Vários empreendimentos foram feitos, mas não se sabia que aquelas terras eram as de Santa Catarina. Os navegantes tiveram de basear-se no que transcrevera o abade Paulmier, e este cometera um erro, dizendo que o capitão Gonneville dobrara o Cabo da Boa Esperança... Assim, todas as expedições malograram. A localização exata das terras descobertas pelo normando veio pelo historiador e geógrafo Armand d’Avezac, que publicou e comentou a Relação de Gonneville em 1869. Esta foi traduzida em português por Tristão de Alencar Araripe em 1886.

A despeito de todas as pesquisas e do bem-constituído livro de Leyla Perrone-Moisés sobre o assunto, levantou-se polêmica sobre a veracidade da viagem empreendida pelo capitão Gonneville e a descendência do índio Essomericq. Tratava-se do resultado de conclusões pessoais do senhor Jacques Levêque de Pontharouart, as quais foram rapidamente postas à prova por estudiosos franceses e vivamente contestadas e descreditadas, pois não possuíam bases sólidas.

No Brasil, o historiador catarinense Amílcar D’Avila de Mello, em sua monumental obra sobre as origens quinhentistas do Estado, dedica um capítulo à viagem de Gonneville. Amílcar indica que haveria possibilidades de que as baías de Guaratuba e Paranaguá fossem o ancoradouro dos pioneiros franceses. Isso não desmente a possibilidade de que tenha sido, de fato, a Baía de Babitonga. Além disso, Amílcar explicita: “Embora ainda não possamos determinar com exatidão o lugar visitado por esses pioneiros, o que está acima de qualquer dúvida, é que eles tocaram um ponto da costa brasileira situado ao sul do trópico de Capricórnio. Nessa região – que chamavam de ‘Índias Meridionais’ – foram recebidos amigavelmente pelos nativos” (Expedições - Santa Catarina na era dos descobrimentos geográficos, volume 1, pág. 159, Expressão, 2005).

A ida do jovem índio à Europa era uma oportunidade para que aprendesse as armas e outros artifícios. Segundo Amílcar D’Avila: “Para os europeus, convinha promover esse ‘estágio’ de indígenas na sua civilização para que a aprendessem bem a sua língua, fé e costumes. Preparados para atuar como mediadores culturais, os nativos ajudariam a relatar aos seus povos as maravilhas que existiam do outro lado do oceano e, dessa maneira, agilizariam a conquista pacífica de suas terras”. (Expedições, pág. 161)

Do lado dos índios, pouco se sabe. O último capítulo do livro de Leyla Perrone-Moisés, intitulado O silêncio de Essomericq, incita à reflexão acerca de porvir desse indígena quando radicado na Normandia do século 16. Aquilo que a pesquisadora denominara como “única página cor-de-rosa” da colonização e que diz respeito ao primeiro índio levado à França é, realmente, ímpar. Nessa história de adoção e aculturação, nada se sabe sobre as impressões do silvícola. Com o tempo, a própria família descendente o incorpora como sendo um “príncipe”, filho de um rei, à sua maneira.

Do lado de cá do Atlântico, onde possivelmente Gonneville encontrou os selvagens, nota-se que a cidade de São Francisco do Sul comemorou os 500 anos de sua fundação em 2004, tomando como base sua descoberta pelos franceses em 1504. Um instituto local, “Binot Paulmier de Gonneville”, convidou, à época, o prefeito de Honfleur para as comemorações. Tem-se uma relação de encantamento mútuo, de um país e de outro, baseada, decerto, no exotismo de um remoto encontro entre índios e franceses que, sem saberem, davam início à globalização. Com suas vantagens e mazelas, sem dúvida.

* Doutora em Literatura Francesa pela USP



POR MÔNICA CRISTINA CORRÊA *